A história do grupo

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O Grupo de Estudos de Educação Infantil e Infâncias (GEIN) atua em pesquisas e na formação acadêmica de professores e gestores no campo da infância deste 1996. Além da pesquisa e da docência na Graduação e no Pós-graduação na Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (FACED/UFRGS), o GEIN vem desenvolvendo atividades de extensão e assessoria, bem como a publicação de livros e artigos sobre formação de professores de educação infantil, infâncias, processos de aprendizagem, sexualidade e gênero, proposições pedagógicas em espaços educativos, entre outras temáticas. A partir do GEIN e da área de Educação Infantil da FACED-UFRGS criamos a linha de pesquisa, junto ao Programa de Pós-graduação em Educação, Estudos Sobre Infãncias, tendo como objetivo central examinar as infâncias e sua educação na multiplicidade e heterogeneidade de espaços e contextos, explorando e examinando as diferentes versões das infâncias na contemporaneidade, suas propostas educativas, bem como as pedagogias e produções culturais direcionadas às crianças.

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Audiência Pública Educação Infantil: avaliação e perspectivas

                                                      

5 DE DEZEMBRO DE 2012

9h
9h30min
CREDENCIAMENTO
9h30min
ABERTURA
Cons. Cezar Miola – Presidente do TCE/RS

9h45min
10h40min

CONFERÊNCIA  - DIREITO À EDUCAÇÃO
Juarez Freitas (Doutor em Direito)

10h45min
12h15min
PAINEL I  – AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL
Alexandre André dos Santos (Diretor do Departamento de Avaliação da Educação Básica – DAEB/INEP) 30min

Rita de Cássia de Freitas Coelho (Coordenadora Geral de Educação Infantil – MEC) 30min
Concepção da Educação Infantil no Brasil: desafios atuais na perspectiva dos Tribunais de Contas

Intervenções dos Partcipantes (30 min.)


INTERVALO
13h30
CREDENCIAMENTO
14h
PAINEL II  – EDUCAÇÃO INFANTIL NO RS: diagnósticos e perspectivas
Hilário Royer – Auditor Público Externo TCE (40min)

Maria Luiza Rodrigues Flores – FACED/UFRGS – Fórum Gaúcho da Educação Infantil (40 min)

Rosangela Rosa – Promotora Regional da Educação – Santo Ângelo (40 min)

Intervenções dos Partcipantes (1h)

17h
ENCERRAMENTO



Objetivo
O objetivo é apresentar um diagnóstico da educação infantil no RS e debater os desafios e perspectivas que se impõem.

Público Alvo:

O evento é aberto à sociedade, mas o público-alvo mais específico deve ser estudantes da área de educação, educadores, secretários municipais de educação, gestores municipais em geral, entre outros.

Local: Auditório Romildo Bolzan

Observação:

Conforme sugestão do Movimento Interforuns de Educação Infantil do Brasil – MIEIB, em manifestação ao TCERS firmada pela Profª Maria Luiza Rodrigues Flores, da Coordenação Colegiada do Fórum Gaúcho de Educação Infantil, são as seguintes as instituições possivelmente interessadas em participar do evento:

  • UNCME/RS
  • UNDIME/RS
  • CEED/RS
  • CME/POA
  • UFRGS
  • Ministério Público
  • TCU
  • Frente Mista pela Educação Infantil da AL
  • Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente
  • Representante do Fórum Estadual de Educação/SEDrUC/RS    

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Consumo, Alimentação e Saúde

Queridos amigos!
Está disponível aqui http://ge.tt/9qvjaTS o material referente á palestra realizada em 22/10 sobre o tema: Consumo, Alimentação e Saúde. 

Bons estudos!


quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Das pesquisas com crianças a complexidade da infância


Sugestão de leitura


Sinopse

De um encontro afortunado, os organizadores desta coletânea reuniram pesquisas que comunicam a complexidade das infâncias instigando-nos a investir nos saberes das próprias crianças, não para reafirmar as incapacidades que a elas foram atribuídas, mas para destacar um conjunto de peculiaridades positivas que diferem as crianças dos adultos. Autoras e autores engajam-se num caminho não linear, com bifurcações que desnaturalizam, problematizam, informam, traduzem e refletem criticamente que a negação ou aceitação das “vozes” infantis depende exclusivamente das concepções de criança e de infância assumidas em um dado contexto histórico-cultural. Concepções que são recentes e nos exigem construir metodologias não convencionais, desafiando-nos a refletir como percebemos as experiências das crianças, os modos como elas participam dos contextos educativos e como estão sendo chamadas para participarem das pesquisas na contemporaneidade.
A inédita publicação, lançada em 2002, junto a esta editora: Por uma cultura da infânciametodologias de pesquisas com crianças, também organizada por Patrícia Prado, em conjunto com Ana Lúcia Goulart de Faria (que prefacia esta obra) e Zeila de Brito Demartini (que abre esta coletânea), além de um sucesso editorial, já em sua 3ª edição, confirma o interesse crescente pelo tema, aqui atualizado e internacionalmente debatido, desafiando conhecer o protagonismo de meninos e meninas e suas condições infantis, para além de uma natureza infantil, por meio da observação, percepção, penetração, participação e interação com elas na configuração coletiva das condições de existência. 

terça-feira, 30 de outubro de 2012

"ConversAÇÕES: Materiais expressivos e crianças"

Queridos colegas,
Nossos encontros estão chegando ao fim! 
Na penúltima Roda de Encontros do GEIN/2012 (12/11)  teremos a palestra "  "ConversAÇÕES: Materiais expressivos e crianças" . Para realizarmos um debate interessante e produtivo, os palestrante deste dia enviaram alguns arquivos e questionamentos  para serem refletidos até o próximo encontro. Vamos levar também nossas anotações pessoais para criar questionamentos nesse dia!







Após a visualização destas imagens, vamos pensar:



1)      Como tu vês essas produções infantis?
2)       Como vocês acham que as crianças interagem com essas práticas pedagógicas?
3)      Será que essas atividades podem contribuir para as aprendizagens em arte?
4)      O que essas atividades ensinam?
5)      Será que essas atividades têm a ver com as produções da arte?

O Texto Como vai a arte na educação infantil? da Professora Susana Rangel também servirá de base para os debates do próximo encontro. 

Bons Estudos!

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Bibliografia utilizada nos debates da última Roda de Estudos


Tem a Tese que está disponível na biblioteca da UFRGS denominada: O privilégio de estar com as crianças: o currículo das infâncias. TROIS,Pereira Loide. UFRGS, fevereiro de 2012.
ALDERSON, Priscilla. As crianças como pesquisadoras: os efeitos dos direitos de participação sobre a metodologia de pesquisa. Campinas: Educação e Sociedade, v. 26, n. 91, ago. 2005 . Disponível em  http://www.scielo.br/scielo.
BAIERLE, A. O dedo no olho: exercícios de ver e transver infâncias. Trabalho de Conclusão do Curso de especialização em educação infantil, São Leopoldo:Unisinos, 2011.
BARBOSA E RICHTER. Os bebês interrogam o currículo.Santa Maria: Revista de Educação da UFSM,v.35,n.1,jan/abril, 2010.
BARBOSA, M. C. Práticas cotidianas na educação infantil – orientações  curricularesBrasília: MEC, 2009.
BARBOSA, M. C. S e HORN, M. G. S. Projetos pedagógicos na educação infantil. Porto Alegre: Artmed, 2008.
BARBOSA, M. C. S. Por amor e por força - rotinas na educação infantil. Porto Alegre: Artmed, 2006.
BARBOSA, M. C.; TROIS, L. P. Mapeamento e análise das propostas pedagógicas municipais para a Educação Infantil no Brasil. Brasília: MEC, 2009.
BARBOSA, M.C & HORN, M. G. Organização do espaço e do tempo na Escola Infantil. In: Educação Infantil - pra que te quero? CRAIDY, C. e KAERCHER, G. Porto Alegre: Artmed, 2001.
BARROS, Manoel. Gramática expositiva do Chão- poesia quase toda.Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira,1990
BARROS, Manoel. Memórias Inventadas – a segunda infância. São Paulo: Planeta do Brasil, 2006.
BARROS, Manoel. O livro das Ignorãças. Rio de Janeiro: Record, 2000.
BARROS,Manoel. Memórias inventadas- a infância.São Paulo: Planeta, 2003.
BARROS,Manoel. Memórias inventadas- a terceira infância.São Paulo: Planeta, 2008.
COHN, C. Antropologia da Criança. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2005.
CORSARO, W. Entrada no campo, aceitação e natureza da participação nos estudos etnográficos com crianças pequenas. Campinas: Revista Educação e Sociedade, v.26, n.91, 2005.
CUNHA, S. R. V. (Org.) Cor, som e movimento – a expressão plástica, musical, dramática no cotidiano da criança. Porto Alegre: Mediação, 2006.
DAHLBERG, G.; MOSS, P. e PENCE, A. Qualidade na educação da Primeira Infância – perspectivas pós-modernas. Porto Alegre: Artmed, 2003.
DELGADO, A. C. e MÜLLER, F. Em busca de metodologias investigativas com as crianças e suas culturas. Cadernos de Pesquisa, v. 35, n. 125, p. 161-179, maio/ago. 2005.  Campinas: Educação e Sociedade, vol. 26, n. 92, p. 1013-1038, Out. 2005 
EDWARDS, C.; GANDINI, L e FORMAN, G. As cem linguagens da criança – a abordagem de Reggio Emilia na Educação da Primeira Infância. Porto Alegre: Artmed,1999.
FARIA,  A. L. G.; DEMARTINI, Z. B. F. e PRADO, P.D. (Org.) Por uma cultura da infância – metodologia de pesquisa com crianças. São Paulo: Autores Associados, 1996.
FARIA, A. L. G e FINCO, D. (orgs) Sociologia da infância no Brasil.Campinas, São Paulo: Autores Associados.2011
FERREIRA. M. Criança tem voz própria – pelo menos na sociologia da infância. Porto, 2005.
GANDINI, L. e EDWARDS, C. Bambini: a abordagem italiana à educação infantil. Porto Alegre: Artmed, 2002.
GOODSON, Ivor F. As políticas de currículo e de escolarização. Petrópolis, Rio de Janeiro:Vozes, 2008.
GOODSON,I. Currículo: teoria e história.São Paulo: Editora Vozes,2008.
HORN, Maria da Graça S. Sabores, cores, sons, aromas – a organização dos espaços na educação infantil. Porto Alegre: Artmed, 2004.
KOHAN, W. (org.) Lugares da infância: filosofia. Rio de Janeiro: DP&A Editora, 2004.
KOHAN, W. Apontamentos filosóficos para uma (nova) política e uma (também nova) educação da infância. Trabalho apresentado no VI Encontro de pesquisa em educação da região Sudeste, Rio de Janeiro, 2004.
KOHAN, W. Infância, estrangeiridade e ignorância: ensaios de filosofia e educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.
KOHAN, W. Infância. Entre educação e filosofia. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.
LARROSA,J. Pedagogia Profana,danças, piruetas e mascaradas.Belo Horizonte: Autêntica, 2004.

MEC – Ministério da Educação e do Desporto.Propostas pedagógicas e currículo em Educação Infantil: um diagnóstico e a construção de uma metodologia de análise. Brasília, 1996.

OLIVEIRA-FORMOSINHO, J, KISHIMOTO, T e PINAZZA, M. (Orgs) Pedagogia(s) da Infância - dialogando com o passado, construindo o futuro. Porto Alegre: Artmed, 2007.
OLIVEIRA-FORMOSINHO, J. (Org.) A escola vista pelas crianças. Portugal: Porto Editora,  2008.
OLIVEIRA-FORMOSINHO, J.; LINO, D; NIZA, S. Modelos curriculares para a educação de infância – construindo uma práxis de participação. Portugal: Porto, 2007.
RICHTER, Sandra R. S . Experiência poética e linguagem plástica na infância. GT: Educação e Arte / n.01,2010.
RICHTER,Sandra Regina Simonis. A marca da infância: quando o fazer é fingir. GTEducação de Crianças de 0 a 6 anos / n.07,2009.
SARMENTO, M. As culturas da infância nas encruzilhadas da segunda modernidade. Minho ,2001,
SARMENTO, M. CERISARA, A. Crianças em miúdos: perspectivas sócio-pedagógicas da infância e educação. Porto: ASA, 2004.
SARMENTO, M. e GOUVEIA, M. C .S.(Org.) Estudos da Infância – educação e práticas sociais. Petrópolis: Vozes, 2008.
SARMENTO, M. J. As culturas da infância nas encruzilhadas da segunda modernidade. In: SARMENTO, M.J. & CERISARA, A. (Org.) Crianças em miúdos: perspectivas sócio-pedagógicas da infância e educação. Porto: ASA, 2004.
SARMENTO, M. J. Gerações e alteridade: interrogações a partir da sociologia da infância.  Campinas: Revista Educação e Sociedade, v.26, n.91, 2005.
SARMENTO, M. J. O estudo de caso etnográfico em educação. In: ZAGO, N. CARVALHO, M. VILELA, R. (Orgs)Itinerários de pesquisa. perspectivas qualitativas em sociologia da educação. D.P&A Editora:Rio de Janeiro, 2003.
SARMENTO, M.; SOARES, N. TOMÁS, C. Políticas públicas e participação infantil. Mimeo.2004.
SARMENTO, Manuel Jacinto. Infância, exclusão social e educação como utopia realizável. Campinas: Revista Educação e Sociedade, v. 23, n. 78, abr. 2002 . http://www.scielo.br/scielo
SERRES,Michel. Variações sobre o corpo.Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2004
Só dez por cento é mentira- a desbiografia oficial de Manoel de Barros. DVD,Produção Artezanato Eletrônico ,2009.
SOARES, N. A investigação participativa no grupo social da infância. In: Currículos sem fronteiras, v.6, n1, 2006.
TONUCCI, F. Quando as crianças dizem: agora chega!Porto Alegre: Artmed, 2005.

terça-feira, 17 de julho de 2012

CARTOGRAFIAS INFANTIS: a cidade pela criança / a fotografia pela infância

O artigo CARTOGRAFIAS INFANTIS: a cidade pela criança / a fotografia pela infância dos autores Luciano Bedin da Costa e Larisa da Veiga Vieira Bandeira, discutido na ultima roda do GEIN, encontra-se disponível clicando aqui.

Encontros com a fantasia: a Linguagem e a Infância na obra de Gianni Rodari

http://www.bibliotecadigital.ufrgs.br/da.php?nrb=000817519&loc=2012&l=8863f082b2f8b459

Cartografar com as crianças: É possível olhar a nossa cidade através do olhar da infância?

http://www.bibliotecadigital.ufrgs.br/da.php?nrb=000817591&loc=2012&l=03fb8db372adc1de

O Privilégio de estar com as crianças: O Currículo das Infâncias

http://www.bibliotecadigital.ufrgs.br/da.php?nrb=000828904&loc=2012&l=39877587bbb382b1

AS ESPECIFICIDADES DA AÇÃO PEDAGÓGICA COM OS BEBÊS


AS ESPECIFICIDADES DA AÇÃO PEDAGÓGICA COM OS BEBÊS
Maria Carmem Barbosa
licabarbosa@uol.com.br
1. PALAVRAS INICIAIS
Em 1988, a Constituição Federal atendendo aos anseios da sociedade,
especialmente o movimento de mulheres: feministas, sindicalistas ou moradoras de
bairros, definiu que o Estado brasileiro deveria garantir a oferta de educação infantil -
pública, gratuita e de qualidade - para as crianças de 0 a 6 anos através do sistema
educacional. Essa proposição legal desencadeou, nas décadas seguintes, uma ampla
expansão dos estabelecimentos de educação infantil. Assim como os demais
documentos dele decorrentes, esse texto legal induziu os municípios a construírem
Centros e Escolas de Educação Infantil que atendessem as crianças de 0 a 6 anos, e com
isto ampliaram, significativamente, o acesso das crianças de 0 a 3 anos às instituições
educacionais públicas.
Nestes vinte anos, a visão constitucional de direito à vaga nas creches e préescolas
para os pais que trabalham vem sendo substituída pela ideia do direito que toda
a criança tem de frequentar uma escola de educação infantil. Isto evidencia uma
significativa mudança na compreensão dos direitos das crianças e também uma
importante aposta na contribuição que a escola de educação infantil pode oferecer às
crianças pequenas e às suas famílias.
As Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil (DCNEI, 2009)
garantindo uma visão sistêmica evidencia que esta instituição deve cumprir suas
funções para garantir o bem-estar das crianças, das famílias e dos profissionais.

Texto completo disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?Itemid=1096&id=15860&option=com_content&view=article



Chimamanda Adichie: O perigo da história única

Vídeo traduzido: http://www.ted.com/talks/lang/pt/chimamanda_adichie_the_danger_of_a_single_story.html

terça-feira, 1 de maio de 2012

Reprodução interpretativa e cultura de pares em crianças


Reprodução interpretativa e cultura de pares em crianças
William A. Corsaro
Indiana University, Bloomington
Tradução: Ana Carvalho


Reprodução interpretativa


Ofereço em meu trabalho uma abordagem à socialização na infância que denomino Reprodução Interpretativa (Corsaro, 2005).


1. O termo interpretativa captura os aspectos inovadores da participação das crianças na sociedade, indicando o fato de que as crianças criam e participam de suas culturas de pares singulares por meio da apropriação de informações do mundo adulto de forma a atender aos seus interesses próprios enquanto crianças.
2. O termo reprodução significa que as crianças não apenas internalizam a cultura, mas contribuem ativamente para a produção e a mudança cultural. Significa também que as crianças são circunscritas pela reprodução cultural. Isto é, crianças e suas infâncias são afetadas pelas sociedades e culturas das quais são membros.


Verifiquei em meus estudos que a produção de sua cultura de pares pelas crianças não é uma questão de simples imitação. As crianças apreendem criativamente informações do mundo adulto para produzir suas culturas singulares.
Defino cultura de pares como um conjunto estável de atividades ou rotinas, artefatos, valores e interesses que as crianças produzem e compartilham na interação com seus pares.

Nesta apresentação vou tratar de dois exemplos de rotinas da cultura de crianças pequenas. Vamos examinar alguns exemplos videogravados dessas rotinas e refletir sobre sua importância na vida cotidiana das crianças. Na conclusão, considero a possibilidade de que essas rotinas sejam aspectos universais das culturas de pares em crianças, dada sua produção em diferentes espaços e tempos.
Brincadeira de aproximação-evitação
Brincadeira de dramatização de papéis

Brincadeira de aproximação-evitação


Exemplo da Apple Girl registrado nas notas de campo.

Apresentacão da seqüência videogravada de aproximação-evitação.

Interromper e perguntar sobre movimentos de porovocação e sua relação com a cultura de pares. Em seguida, mostrar o resto da seqüência e dizer que vamos falar sobre cada fase.

Apresentar slides 4 a 7 explicando as fases de aproximação-evitação.

Como discutirei mais adiante, a estrutura básica de aproximação-evitação aparece em exemplos formais de brincadeiras com regras, como La Strega (A Bruxa) na Itália, e muitas outras.

Apresentar slides 8 e 9

II. Importância da aproximação-evitação na cultura de pares

A.     O agente que ameaça é em última instância controlado pelas crianças ameaçadas
B.     A estrutura da rotina produz acumulação e liberação de tensão
C.     As crianças ameaçadas podem iniciar, reciclar, acrescentar elementos (“enriquecer”) e encerrar a rotina.

III. Implicações da aproximação-evitação para a Reprodução Interpretativa

A.     As crianças produzem coletivamente uma rotina na qual compartilham a acumulação de tensão, a excitação da ameaça, e o alívio e alegria da fuga.
B.     As representações sociais de perigo, mal, desconhecido e outras ambigüidades, que estão se desenvolvendo nas crianças, são mais firmemente apreendidas e controladas.

Como discutirei adiante, a estrutura básica de aproximação-evitação parece ser a base de muitos tipos de brincadeiras de perseguição e fuga de crianças em todo o mundo. É interessante notar que observamos esta rotina espontânea em crianças muito pequenas, mesmo antes que estejam brincando de brincadeiras mais formais que mais tarde se constroem sobre esta rotina.


Brincadeiras de dramatização de papéis


Pesquisadores que estudam crianças argumentam já há muito tempo a respeito da importância de brincadeiras de dramatização de papéis para o desenvolvimento social e emocional das crianças. Tal como a maioria dos adultos, esses pesquisadores quase sempre vêm os jogos de papéis como imitação direta de modelos adultos. No entanto, as crianças não imitam simplesmente modelos adultos nessas brincadeiras, mas antes elaboram e enriquecem continuamente os modelos adultos para atender seus próprios interesses.
A apropriação e enriquecimento de modelos adultos pelas crianças se refere primariamente a status, poder e controle. Ao assumir papéis adultos, as crianças adquirem poder (são “empoderadas”). Elas utilizam a licença dramática da brincadeira imaginativa para projetar o futuro – a época em que elas terão poder e controle sobre si mesmas e sobre os outros.
Jogos de papéis também permitem que a criança faça experiências sobre como diferentes tipos de pessoas da sociedade agem e se relacionam entre si. Um aspecto de grande importância para as crianças é o gênero e as expectativas sobre comportamento de meninas e meninas e a forma como papéis são socialmente estereotipados por gênero. Novamente veremos aqui que as crianças não aceitam esses estereótipos, mas os desafiam e refinam. Assim, expectativas de gênero não são simplesmente inculcadas nas crianças pelos adultos, mas são socialmente construídas pelas crianças nas interações com adultos e entre si.

Jogo de papéis e poder social


As crianças começam a brincar de papéis já aos dois anos de idade, e a maior parte dos jogos de papéis entre dois e cinco anos é sobre expressão de poder. Em minha dissertação, eu estava interessado no uso da linguagem na brincadeira entre um irmão e uma irmã, Krister e Mia, e um segundo garoto, Buddy. Em uma das sessões de brincadeira, Mia (que tinha quatro anos e tinha estado na pré-escola) e os dois meninos (ambos com cerca de dois anos e meio e sem experiência de pré-escola) iniciaram uma seqüência de jogo de papéis quando Mia sugeriu que brincassem de professor. Krister quis ser o professor, e trouxe uma cadeira para a frente de um grande quadro negro existente na sala. Mia, Buddy e eu nos sentamos no chão, como alunos.
Krister pegou o giz e disse: “Agora escrevam isto!”, e desenhou diversas linhas.
“Isso não são letras, são só linhas”, eu provoquei.
“Ele ainda não escreve bem”, me respondeu Mia meio aborrecida. “Faça de conta que são letras”.
Mas Krister não permitiu que sua autoridade fosse desafiada. Gritou comigo: “Bill, você é mau! Vá sentar no canto agora mesmo!”. Krister apontou para um canto da sala e eu peguei minha folha de papel e fui sentar lá. Buddy e Mia começaram a rir, mas Krister deu mais algumas ordens sobre o que devia ser escrito, e Mia, Buddy e eu o atendemos.
Vemos aqui uma criança pequena, que não tinha experiência de escola, mas tinha a informação de que professores são poderosos e dizem às crianças o que elas devem fazer. Além disso, garotos mal comportados têm que se sentar no canto. Será que Krister aprendeu isso com Mia? É possível, mas não a partir da experiência dela na pré-escola. O pai deles me garantiu que na escola de Mia não se mandava criança sentar no canto. Talvez a informação tenha vindo de algo na televisão, tal como um desenho animado ou uma brincadeira de adultos sobre crianças que não se comportam bem na escola terem que sentar no canto. A fonte da informação de Krister importa menos do que seu desejo de expressar o poder que se tem em um papel adulto e hierarquicamente superior (isto é, um papel com o maior poder ou autoridade), uma situação em que as crianças raramente se encontram.
No jogo sócio-dramático as crianças desfrutam a assunção e expressão de poder. É divertido. Em um episódio complexo de jogo de papéis de meu trabalho em Berkeley, as crianças (todas em torno de quatro anos de idade) claramente expressavam poder e controle nos papéis hierarquicamente superiores, se comportavam mal e obedeciam nos papéis subordinados, cooperavam nos papéis de status equivalente, mas se confundiam a respeito do arranjo e das expectativas de gênero em outros papéis.
Um menino, Bill, e uma menina, Rita, entraram no andar de cima da casa de bonecas levando bolsas e uma maleta. Antes de subir eles tinham combinado a respeito dos papéis de marido e mulher. Depois de deixarem as bolsas e maleta no chão, eles olharam para as crianças que brincavam no piso inferior da sala. Viram dois meninos, Charles e Denny, engatinhando e miando como gatos. Agora vou mostrar um vídeo dessa brincadeira, e vocês podem acompanhar na transcrição.

Apresentar vídeo do jogo de papéis “Dois maridos”


(Referir ao exemplo 1 da transcrição)

Vemos nesta seqüência que o marido e a mulher expressam claramente sua autoridade sobre os gatinhos por meio do uso de imperativos expressos com entonações fortes e acompanhados por gestos de controle. Mas vemos também que os gatinhos provocam essas manifestações fortes através de mau comportamento e resistência. De fato, em muitos episódios de jogo de papéis os subordinados (crianças, ou animais de estimação) freqüentemente se comportavam mal, fazendo exatamente o que lhes era dito para não fazerem!
Nesse processo emergem enredos de disciplina com uma estrutura de linguagem semelhante à que vimos acima, na qual o poder é claramente exibido e imposto. È como se as crianças quisessem que isso acontecesse. Elas querem criar e compartilhar emocionalmente o poder e controle que os adultos têm sobre elas.
Depois que os gatinhos foram embora, marido e mulher decidiram que a casa precisava de uma limpeza. Em harmonia com papéis estereotipados de gênero, Bill arrastou os móveis enquanto sua esposa, Rita, limpava o chão. Aqui as crianças trabalham juntas em acordo com expectativas estereotipadas de gênero que se expressam em ações (isto é, maridos são fortes e ajudam arrastando os móveis enquanto as mulheres fazem a limpeza) e são reforçadas em avaliações verbais (por exemplo, Rita nota que Bill é um homem forte e prestativo).
Enquanto Rita está fazendo de conta que enxuga o chão, os gatinhos voltam. Bill tenta impedir que eles entrem, mas eles correm para dentro no chão recém limpo. Bill tenta enxotá-los de volta para a escada.
Nesta seqüência o jogo de papéis encontra um obstáculo, pelo menos para Rita, quando Denny decide que não quer mais ser um gato. Talvez ele estivesse ficando cansado de ser enxotado pela escada. De qualquer forma, Bill sugere que Denny também seja marido e quando Denny aceita ele diz: “Tá bom, precisamos de dois maridos”. Não fica claro porque Bill faz essa proposta. Provavelmente, como Denny é um menino, e homens são maridos, Bill acha que Denny deve ser um marido, como ele próprio.
Rita, no entanto, pensa de outra forma, e vê um problema que vai além dos estereótipos de gênero: uma mulher e dois maridos. Enquanto os meninos dançam e comemoram os papéis de dois maridos, Rita argumenta sem sucesso que ela não pode conquistar, ter, casar com, ou amar dois maridos.
Ela sabe que há alguma coisa errada nessa relação (pelo menos entre os adultos de sua cultura). O que há de errado tem a ver com sua compreensão emergente de que os papéis de marido e mulher não são apenas específicos dos gêneros, mas também se relacionam entre si de maneiras particulares. Maridos e mulheres se amam e se casam. Está até pressuposto que isso ocorre em sua relação de faz de conta com Bill. Mas o que é que ela vai fazer com Denny?
Ela parece oferecer a Denny o papel de avó: “Não posso ter dois maridos porque tenho uma avó”. Mas sua frase é confusa e avó está no gênero errado – se fosse avô poderia ter funcionado. É interessante o contraste entre o entusiasmo dos meninos por serem dois maridos – Bill chega a sugerir que eles se casem, mas a cerimônia não ocorre – e o desconforto de Rita com essa proposta. No final, ela resolve o problema tornando-se um gatinho, e a brincadeira continua com um retorno a mau comportamento e disciplina.
No entanto, Rita teve uma percepção sobre a complexidade das relações de papéis. Nos termos de Piaget, ela teve um desequilíbrio em seu sentido do mundo social e tentou compensá-lo. Vemos, portanto, que o jogo de papéis é diversão e improvisação, é imprevisível e rico de oportunidades para reflexão e aprendizagem. 

Non C’e Zuppa Inglese: Ajustando o contexto no jogo de papéis

O jogo de papéis envolve mais do que a aprendizagem de conhecimentos sociais específicos; envolve também aprender a relação entre contexto e comportamento. Como argumenta o antropólogo Gregory Bateson (1956), ao brincar de papéis a criança não aprende apenas algo a respeito da posição social específica daquele papel, mas “aprende também que existem papéis”. Segundo Bateson (1956), a criança “adquire um novo modo de ver, parcialmente flexível e parcialmente rígido”, e aprende “o fato da flexibilidade estilística e o fato de que a escolha de estilo ou de papel está relacionada à ‘moldura’ ou contexto do comportamento”.
O reconhecimento, pela criança, do “poder transformador” da brincadeira é um elemento importante da cultura de pares. É ao uso que ela faz desse poder transformador no jogo de papéis que vou me referir como “ajustando o contexto”, em acordo com Bateson e com o sociólogo Irving Goffman (1974). Vamos ver um exemplo.
Em Bolonha, Emília, uma menina, fez uma loja de sorvete com duas de suas amigas. Ela se aproximou de onde eu estava brincando com três meninos, Alberto, Alessio e Stefano. Estou com o microfone na mão porque estamos videogravando a brincadeira (Corsaro, 2003).
Vamos ver o vídeo desse exemplo, e depois ler a tradução do que as crianças estão dizendo.


Neste exemplo, Emilia quer inicialmente permanecer no contexto delimitado do fazer de conta que tem uma pequena loja de sorvete, com sabores que podem ser representados por objetos existentes no pátio: lixo, folhas etc. Embora eu tenha dificuldades para fazer meu pedido, por causa do meu italiano ainda meio precário, permaneço no contexto e aceito, ou antes, proponho “chocolate”, um sabor que sei que ela tem. Mas Stefano, e depois Alberto, dizem mais ou menos: “Qual é a graça disso?!” Eles ajustam ou ampliam o contexto pedindo de propósito os sabores que sabem que Emilia não tem, ou  faz de conta que não tem. Assim, todo o jogo de papéis passa a ser sobre “brincar com a brincadeira”.
Esta reviravolta nos eventos fica mais clara quando Alberto chama Emilia quando ela está se afastando, e pede zuppa inglese (um sabor raro de sorvete, associado a uma sobremesa inglesa[2]). Nessa altura, até eu entendo o que está acontecendo, e me associo às risadas dos outros meninos diante do pedido de Alberto. Emilia, fingindo-se aborrecida, está claramente se divertindo em lidar com Alberto. Ela desfruta a oportunidade de recusar o pedido, respondendo “Non c’e zuppa inglese!”. A resposta de Alberto a isso é pedir banana! Mais tarde, no entanto, Emilia dá um pouco o braço a torcer, e diz que pode ser que tenha pistache e que vai checar se tem refrigerante de laranja.

Conclusão


Brincadeira e cultura de pares hoje e em outras épocas e lugares

Serão as brincadeiras de aproximação-evitação e o jogo de papéis aspectos universais da cultura de pares em crianças?

Aproximação-evitação


A aproximação – evitação tal como vimos na rotina do exemplo anterior é um tipo de brincadeira que tem sido documentado em diferentes épocas e diferentes culturas. Relaciona-se claramente com diversas brincadeiras de perseguição e fuga em que uma criança assume o papel de agente ameaçador.
Em meu trabalho na Itália (Corsaro,2005), documentei uma brincadeira chamada La Strega,ou A Bruxa, que tem diversas variações dos aspectos básicos da rotina de aproximação-evitação que comentamos aqui.
Esse tipo de brincadeira também foi documentado entre crianças !Kung na Nambia, Sudoeste da África, pela antropóloga Lorna Marshall em 1950-1960. As crianças brincavam de um jogo chamado “sapos”, um inverso do “Mamãe, eu posso?” A brincadeira começa com a escolha de uma criança para ser “mãe de todos”, as demais crianças sentando-se em círculo. Quando a mãe toca uma criança com uma vareta, a criança finge que está dormindo. Quando todas as crianças estão dormindo, a mãe arranca cabelos de sua cabeça e os coloca em um caldeirão imaginário para cozinharem. Os cabelos são “sapos” que foram caçados para serem comidos. Quando os sapos estão cozidos, a mãe acorda os filhos um por um e pede a cada um que vá buscar seu pilão e a mão do pilão para que ela termine de preparar os sapos. Mas as crianças se recusam, então a mãe, zangada, vai ela mesma buscar o pilão e a mão de pilão. Enquanto ela está longe, as crianças roubam os sapos e fogem para se esconder. Quando a mãe volta, ela finge estar muito zangada e persegue as crianças.
Quando encontra uma criança, bate nela com o dedo. Essa ação “quebra a cabeça” de forma que os “ miolos da criança escorrem para fora”, e a mão então finge beber os “miolos”. A parte final da brincadeira freqüentemente resulta em caos, quando as crianças tentam escapar da mãe. Em seguida as crianças passam a perseguir umas às outras, rindo e batendo nas cabeças umas das outras (Marshall, 1976, citado em Schwartzman, 1978, p. 126).      
É óbvia a correspondência com a seqüência de aproximação-evitação que vimos antes, embora a brincadeira seja mais elaborada e complexa.

Jogo de papéis


A historiadora Barbara Hanawalt, em seu livro Growing up in Medieval London (1993) relata que as crianças da Londres medieval envolviam-se em dramatização de papéis tais como reproduzir a celebração de cerimônias religiosas e casamentos.
Com base em entrevistas com ex-escravos, Lester Alston (1992) e David Wiggins (1985) relatam que crianças escravas da época anterior à Guerra Civil nos EUA envolviam-se em uma diversidade de tipos de jogos de papéis, que novamente incluíam cerimônias religiosas, como batismos, e especialmente “leilões de escravos”, que claramente ajudavam as crianças a lidar com as fortes emoções provocadas pela possibilidade de serem separadas de suas famílias nas comunidades escravas.
Cindi Katz, em seu trabalho etnográfico sobre brincadeira e trabalho entre crianças sudanesas de áreas rurais na década de 80, documentou jogos de papéis elaborados e claramente associados a atividades adultas. Os meninos reproduziam diversas atividades relacionadas com a agricultura e o comércio e seus ganhos decorrentes daquelas atividades. Um aspecto central da brincadeira era um trator de brinquedo feito por um dos meninos, com a ajuda de um irmão mais velho, a partir de diversos objetos descartados (sucata). Os meninos fizeram um arado para o trator, e reproduziam cooperativamente e trabalhosamente todos os diversos elementos do trabalho agrícola, desde revolver o solo com o arado, plantar e regar a plantação, até irrigação, tirar mato, e finalmente colher e levar o produto da colheita a um armazém de faz de conta. Também reproduziam o processo de vender a colheita usando dinheiro de mentira. Finalmente, usavam os lucros de faz de conta para brincar de loja, onde compravam uma variedade de produtos representados por objetos como pedaços de metal e vidro e restos de baterias (Katz, 2004, p. 12-13).
A brincadeira das meninas também era elaborada. Faziam bonecas de palha, nomeavam as bonecas, que representava homens e mulheres de todas as idades, e brincavam com as bonecas em casas ‘que criavam com divisórias feitas de sapatos, pilões, tijolos e pedaços de lata’ (Katz, 2004, p.17).
As meninas usavam esses suportes materiais para encenar uma variedade de atividades domésticas como cozinhar, comer, buscar água no poço e fazer visitas. Essas atividades, embora próximas do modelo adulto, eram altamente inovadoras em comparação com os brinquedos de crianças ocidentais pela forma inventiva de uso pelas crianças de uma variedade de materiais naturais ou sucata.
Em suma, há evidências significativas em apoio à proposição de que rotinas de aproximação-evitação e brincadeiras de dramatização de papéis são elementos universais das culturas de pares em crianças. No entanto, são necessários mais estudos sobre a brincadeira de crianças em muitos outros grupos culturais para sustentar inteiramente essa proposição e apreender a diversidade de estilos e de natureza dessas importantes rotinas lúdicas na vida cotidiana das crianças.

Referências
Alston, L. (1992). Children as chattel. In E. West & P. Petrick (Eds.), Small worlds (pp. 208-231). Lawrence, KS: University Press of Kansas.
Bateson, G. (1956). “This is play” in Group processes: Transactions of the second conference. New York: Joseph Macey, Jr. Foundation.
Corsaro, W. (2003). “We’re friends, right?: Inside kids’ culture. Washington, D.C.: Joseph Henry Press.
Corsaro, W. (2005). The Sociology of Childhood. 2nd edition. Thousand Oaks, CA: Pine Forge Press.
Goffman, E. (1974). Frame analysis. New York: Harper & Row.
Hanawalt, B. (1993). Growing up in medieval London. New York: Oxford University Press.
Katz, Cindi. (2004). Growing up global. Minneapolis, MN: University of Minnesota Press.
Marshall, L. (1976). The !Kung of Nyae Nyae. Cambridge, MA: Harvard University Press.
Schwartzman, H. (1978). Transformations: The anthropology of children’s play New York: Plenum.
Wiggins, D. (1985). The play of slave children in the plantation communities of the old South, 1820-60. In N. Hiner & J. Hawes (Eds.), Growing up in America: Children in historical perspective (pp. 173-192). Urbana, IL: University of Illinois Press.


[1] NT: Preservei a palavra “pares”, mas fique claro que o sentido não é o de duplas, e sim de parceiros, de iguais – como em “pares do reino”. Em nosso próprio trabalho, preferimos a expressão Cultura do grupo de brinquedo.
[2] Trifle: um bolo tipo pão-de-ló, umedecido com vinho, coberto com geléia e molho de creme, chantilly etc..


*** este texto é parte de uma apresentação, portanto, contém algumas anotações feitas pelo autor para organizar a mesma. 

Pesquisa etnográfica realizada com as crianças de Jardins de Infância nos EUA e em Itália.


Pesquisa etnográfica realizada com as crianças de Jardins de Infância nos EUA e em Itália.

William Corsaro,
Departamento de Sociologia, Indiana University
Bloomington, Indiana, USA


Entrada no terreno, aceitação e natureza da participação em estudos etnográficos com crianças pequenas.

Tal como Tom Rizzo, Jack Bates e eu próprio argumentámos num artigo publicado há uns anos atrás (Rizzo, Corsaro & Bates, 1992), a entrada no terreno é crucial na etnografia, uma vez que um dos seus objectivos principais, enquanto método interpretativo, é o estabelecimento do estatuto de membro e a adopção de uma perspectiva ou ponto de vista “dos de dentro”. Descobri que a aceitação no mundo das crianças pode ser especialmente desafiadora, devido às diferenças óbvias entre adultos e crianças em termos de maturidade cognitiva e comunicativa, poder (tanto real como percebido) e tamanho físico (Corsaro, 1985).
Enquanto alguns etnógrafos de crianças (Mandell, 1988) advogam que a completa aceitação (dos investigadores pelas crianças) é possível e a participação completa (pelos investigadores nos mundos das crianças) é desejável, outros argumentam que certas diferenças entre adultos e crianças (particularmente o tamanho físico) não pode ser completamente ultrapassado e, portanto, sugerem algumas formas de participação limitada ou periférica (Corsaro, 1985; Fine & Sandstorm, 1988). Outros ainda argumentam que estudar as suas próprias crianças, os pais como investigadores (Adler & Adler, 1998) pode obviar muitos dos desafios e ultrapassar a necessidade de constituir o que designam por “investigador-de-ocasião[1] e, portanto, uma espécie de relação artificial”. Todavia, para mim, a estratégia dos pais como investigadores levanta uma série de conflitos de papel que excedem a sua utilidade prática. Em qualquer um dos casos, as decisões relativas ao grau e à natureza da participação variarão dado o terreno particular da etnografia.
Independentemente da posição de cada um acerca do grau de participação, é necessária documentação [para formalizar] para a entrada, a aceitação e participação em estudos etnográficos, por várias razões. Muito obviamente, tal documentação permite prevenir possíveis efeitos disruptivos do processo de pesquisa no normal desenrolar das rotinas e práticas culturais. Aqui a preocupação vai além do grau de participação para o registo dos efeitos das práticas da rotina de recolha de dados (como a entrevista informal, registos, gravação audiovisual e recolha de artefactos). Em segundo lugar, e de um modo mais subtil, uma vez que a entrada, aceitação e participação são processos com histórias em desenvolvimento, o seu registo fornece elementos acerca dos processos produtivos e reprodutivos nas culturas locais.
Creio que todas as etnografias beneficiariam (tanto metodologica como teoricamente) de um registo cuidadoso do processo de entrada no terreno. Uma vez mais, quero sublinhar que tal registo nunca pode estar completamente incluído nas publicações porque, num sentido prático, seria um longo capítulo, artigo enorme, ou até um livro acerca de e em si próprio. Por exemplo, muitas vezes, nas descrições do meu primeiro trabalho eu disfarcei/encobri a minha aceitação pelos adultos (primeiramente, professores) por referências em lidar com “os porteiros”. Contudo, no meu último trabalho em Itália, tal como discuti num artigo com a minha colega Luisa Molinari (Corsaro & Molinari, 2000), demos muito mais atenção à nossa aceitação pelos professores e trabalhámos em equipa para levar a cabo a entrada no terreno.
Neste artigo revejo como é que desencadeei a entrada no terreno e a aceitação em escolas e culturas de pares locais, em vários dos JI que estudei ao longo dos últimos 28 anos. Ao longo deste tempo, tenho visto o meu trabalho a deslocar-se de uma pesquisa sobre para uma pesquisa com crianças (cf. Christensen & James, 2000).

Tornar-me um etnógrafo das culturas dos miúdos
“Entrei na parte de fora da área de brincar do JI e caminhei para junto de duas meninas de 4 anos, Betty e Jenny, que estavam sentadas num monte de areia. Assim que cheguei junto delas, Betty disse: “Tu não podes brincar connosco!”
“Porque não?” – perguntei eu.
“Porque és muito grande” – respondeu a Betty.
“Eu sento-me” – disse eu enquanto me sentava na a areia perto das meninas.
“Ainda estás muito grande”, disse a Jenny.
“Yeah, és o Bill Grande!” – gritou a Betty.
“Posso ficar a olhar?” – perguntei.
“Okay.” – disse a Jenny. “Mas não tocas em nada!”
“Yeah”, disse Betty, “Ficas só a olhar, está bem?”
“Ok”.
“Ok, Bill Grande!”, disse a Jenny.
“Ok.”
(Mais tarde, Bill Grande, foi brincar.)

Etnografia é o método que os antropólogos utilizam mais frequentemente para estudar culturas exóticas. Este método requer que o investigador entre, seja aceite e participe nas vidas daqueles que estuda. Neste sentido, a etnografia implica, por assim dizer, “tornar-se nativo”. Estou convencido de que as crianças têm as suas próprias culturas e eu sempre quis tornar-me parte de e documentá-las. Para fazer isso eu precisei de entrar nas vidas quotidianas das crianças – para ser uma das crianças o melhor que pudesse.
Mas como é que um homem crescido faz para ser aceite nos mundos das crianças? Quando pela primeira vez iniciei a minha pesquisa não havia modelos estabelecidos para seguir. Por isso quando entrei no primeiro dos muitos JI que tenho estudado nos EUA e na Itália, decidi que a melhor maneira de me tornar parte dos mundos das crianças era “não agir como um adulto típico”. Este artigo descreve como é que eu fiz isso em vários dos diferentes contextos de educação pré-escolar de que me tornei parte e partilhei com as crianças, os seus professores e pais. Vamos começar pelo início, há muitos anos atrás em Berkeley, Califórnia.

Berkerley, Califórnia (1974-75)

Quando me preparava para a minha pesquisa em Berkeley, tomei em consideração o conselho de um dos professores e passei várias semanas a observar a interacção na escola de uma área de observação restrita. Margaret, a professora, observou que nas primeiras semanas de aulas as crianças estavam ainda se estavam a adaptar ao novo contexto e os pais e professores estavam também um pouco tensos com o início do novo ano. Por isso, ela sugeriu que eu observasse apenas uma área delimitada[2] em vez da área extensa da escola, no seu interior e exterior. Esta área de observação era usada pelos pais e por alguns psicólogos do desenvolvimento da universidade mais próxima que realizavam observações para pesquisa. Nos meus primeiros dias de observação fiquei esmagado pelo número, variação e complexidade dos eventos interactivos que se desenrolavam sob os meus olhos. No primeiro dia, eu não tinha uma ideia clara de como registar as minhas notas de campo, por isso limitei-me a olhar e tentar perceber o sentido geral das coisas. Nos dias que seguiram, comecei a focalizar no que acontecia na escola, quando e onde, e descobri uma rotina geral. Comecei também a fazer um levantamento das várias actividades eram que as crianças participavam, incluindo as que eram dirigidas pelos professores e as que elas próprias criavam. Gradualmente, também aprendi os nomes das crianças e, até certo ponto, as suas várias personalidades.
Durante a terceira semana comecei a pensar como é que ia entrar e ser aceite dentro deste grupo de crianças que cada vez se me tornavam mais familiares. Uma vez que eu queria tentar envolver-me directamente nas interacções entre pares das crianças, sabia que não queria ser visto como um adulto típico. O primeiro passo para descobrir como é que isto se fazia foi observar de perto como é que os adultos interagiam com as crianças. Aqui está o que observei.
Os adultos eram, antes mais, activos e controlavam a sua interacção com as crianças. Por exemplo, os pais e outros visitantes adultos da escola, aproximavam-se frequentemente das crianças, iniciavam a interacção e faziam uma série de perguntas:

Um dia, uma mãe que visitava o JI, aproximou-se de uma mesa onde estavam duas meninas a desenhar. A mãe olhou por momentos, inclinou-se e olhou para baixo, para as meninas.
“O que estás a desenhar?” – perguntou ela.
“Uma árvore” – respondeu uma das meninas.
Faz-se um silêncio enquanto as meninas continuam o seu trabalho.
“Que cor é a árvore?” - pergunta a mãe.
“Verde”, diz a menina, sem olhar e continuando a desenhar.
“Que mais outras coisas são verdes?” – perguntou a mãe.
Outro silêncio e depois a outra menina disse: “Erva”.
A mãe endireitou-se, olhou em volta da sala e seguiu em direcção a outra área.

Os adultos querem iniciar conversas com as crianças mas sentem-se desconfortáveis com as respostas minimais das crianças e a sua tolerância do que (para os adultos) parecem ser longos silêncios. Frequentemente, tal como no exemplo acima descrito, os adultos começam a fazer perguntas tipo teste (coisas de que já sabem a resposta, como a cor da árvore) para ver o que as crianças pensam acerca do que estão a fazer ou simplesmente para fazer da troca de palavras uma experiência de aprendizagem.
Os professores também fazem muitas perguntas. Contudo, são mais sofisticados em desenvolver o potencial de aprendizagem das suas conversas e interacções com as crianças. Também dirigem e monitorizam as brincadeiras das crianças, ajudam quando há problemas e dizem-lhes o que podem ou não podem fazer. Finalmente, descobri que os adultos (professores ou visitantes) restringiam o seu contacto com as crianças a áreas específicas do JI. Os adultos raramente entravam na “casinha”, no monte de areia do recreio, barras ou casa de trepar.
Vendo como os adultos eram tão activos e controladores nas interacções com as crianças no JI, decidi adoptar uma estratégia de entrada “reactiva”. Na primeira semana na escola, disponibilizei-me continuamente em áreas do JI dominadas pelas crianças e esperei que as crianças reagissem à minha presença. Durante os primeiros dias, os resultados não foram encorajadores. Para além de vários sorrisos e olhares fixos perplexos, as crianças ignoraram-me bastante. Das centenas de horas que tenho observado em JI, estas foram as mais difíceis para mim. Eu queria dizer alguma coisa (“qualquer coisa”) às crianças mas mantive-me com a minha estratégia e permanci silencioso.

Na quarta tarde que passei no JI, parei no monte de areia do recreio, mesmo por trás de um grupo de 5 crianças que estavam a escavar a areia com pás. Estavam a fazer “trabalho de construção” com dois patrões e três trabalhadores (4 rapazes e 1 rapariga). A construção envolvia dois dos rapazes a escavarem um buraco na areia e um outro a enchê-lo de água, enquanto o quarto rapaz (o “controlador da barragem”) cravava, tirava, voltava a cravar a sua pá em vários pontos do buraco para criar uma barragem. Ele faziam isto sob as ordens das raparigas-patrões. Observei este jogo complexo para cima de 40m. Depois, os primeiros dois rapazes e pouco depois os restantes dois, cravaram as suas pás na areia e correram para dentro da escola com os “patrões” atrás deles. Suspeitei que não planeassem voltar e que o projecto de construção fora abandonado.
Sentia-me inquieto e ponderava a minha próxima deslocação quando reparei na Sue. Ela estava parada, sozinha, perto do monte de areia, a cerca de um metro de distância e, definitivamente, estava a observar-me. Sorri-lhe e ela sorriu-me, mas depois, para meu espanto, ela correu para perto da caixa de areia e ficou a olhar um grupo de outras meninas. Depois, ouvi uma agitação perto das barras para trepar. Olhei para lá e vi que o Peter tinha tirado (pelo menos, Daniel protestava), o camião do Daniel. Reparei que uma professora tinha chegado para resolver a disputa. Quando voltei a olhar para a caixa de areia, a Sue tinha-se ido embora.
Comecei a levantar-me para me deslocar para dentro da escola, mas depois ouvi alguém dizer “O que t’as a fazer?”. Sue tinha-se aproximado por trás e estava perto de mim no monte de areia.
“Só a olhar” – disse.
“P’ra quê?” – perguntou ela.
“Porque gosto”
Depois a Sue perguntou-me o meu nome e eu disse (e esto veio a revelar-se ser importante) “Eu sou o Bill e tu és a Sue”.
Sue recuou dois passos e perguntou “Como é que sabes o meu nome?”
Fiz qualquer coisa que os adultos raramente fazem quando falam com crianças pequenas, especialmente se pensam que as crianças não perceberão a resposta. Disse a verdade sem tentar simplificar.
“Ouvi a Laura e outros meninos a chamarem-te Sue”.
“Mas como é que tu sabes o meu nome?” – perguntou ela de novo.
“Bramindo das minhas armas”, repeti que tinha ouvido as outras crianças chamarem-lhe Sue. Sue olhou-me perplexa, deu meia-volta e correu para dentro da escola.
Ali estava eu, tendo passado vários dias a tentar tornar-me uma das crianças. Finalmente, uma criança falou comigo e eu afugentei-a! Mas depois, a Sue, apareceu vinda da escola e voltou a correr para junto de mim com o Jonathan ao lado dela.
Quando me alcançaram, Jonathan perguntou “Qual é o meu nome?”
“Jonathan” – respondi.
“Como é que tu sabes o meu nome?”
“Ouvi o Peter [um dos seus parceiros mais frequente] e algumas das outras crianças chamaram-te Jonathan” – disse eu.
“Estão a ver, eu bem disse que ele sabia magia” disse Sue.
“Não, não... calma aí!” – disse cautelosamente Jonathan. “Quem é aquele menino ali?”  - perguntou ele, apontando para Lanny e Frank.
“Lanny e Frank” – respondi eu cheio de confiança. Eu conhecia todas as crianças.
Jonathan olhou em volta, tentando encontrar um menino que fosse difícil e depois perguntou-me o nome de mais três. Identifiquei-os a todos facilmente.
Com um sorriso malandro, Jonathan perguntou-me então: “Ok, qual é o nome da minha irmã mais nova?”
Joanathan pensou que me tinha “apanhado”, mas na verdade eu sabia o nome da sua irmã. A secretaria da escola tinha-me fornecido uma lista com os nomes das crianças, dos seus pais e irmãos. Eu tinha memorizado muita desta informação e, felizmente para mim, lembrava-me do nome da irmã do Jonathan.
“Alicia!” – declarei eu. Sentia-me muito bem, agora.
Jonathan estava muito impressionado. Olhou para a Sue e disse: “Eh pá, eu não acredito!”. Depois, desatou a correr para contar ao Peter e ao Daniel.
Entretanto, a Sue passou-me uma pá
“Queres escavar?”
“Claro”, disse eu pegando na pá.
Escavámos a areia para dentro dos baldes e depressa se nos juntou o Jonathan, Peter e Daniel. Peter e Daniel perguntaram-me se eu sabia os seus nomes. Claro que eu sabia e disse-lhos. Depois, começamos todos a cavar e as crianças organizaram um outro projecto de construção em que eu fui designado para o papel de trabalhador. Christopher e Antoinette também se juntaram a nós e o jogo continou cerca de mais 20 minutos até que uma das professoras anunciou que era a “hora de arrumar”, pelo que nós, relutantemente, largámos as nossas pás e fomos para dentro.

Nos vários dias que se seguiram após esta passagem para “o lado de lá”, as crianças começaram a reagir à minha presença (perguntavam quem eu era) e convidaram-me para entrar no seu jogo. Apesar de eu ser capaz de observar e, em muitos casos, de participar até certo ponto nas brincadeiras das crianças, a minha aceitação foi gradual. Durante o primeiro mês, as crianças estavam curiosas acerca de mim e do porquê eu estar por ali todos os dias. Fizeram-me muitas perguntas que seguiram a sequência geral: “Quem és tu?”, “És professor?”, “Vens jogar um jogo connosco?” [i.é. esta é a pergunta que é feita às crianças quando as querem envolver em experiências de investigação que ocorrem rotineiramente nesta escola laboratório], “És pai?” e “Tens algum irmão ou irmã?”. O padrão aqui é importante. As crianças deslocaram-se das questões gerais acerca das características adultas para as últimas questões acerca dos irmãos, que é uma das que as crianças tipicamente perguntam umas às outras.
Na altura deste primeiro estudo, a minha resposta a todas as perguntas acerca da informação adulta foram “não” porque eu não era professor, investigador experimental ou pai. Mas eu tinha irmãos – sete! Ter tantos irmãos e irmãs aguçou a curiosidade das crianças acerca de mim. Todavia, hesitavam em acreditar-me e alguns perguntaram “A sério?”. Depois, para sua delícia nomeei-os a todos. Pertencer a uma grande família ajudou a solidificar a minha aceitação e posição no grupo.
Não pretendo declarar que as crianças rapidamente me aceitaram como uma delas. Nunca em todos estes meus muitos anos nos JI fui alguma vez totalmente visto como uma das crianças. Até mesmo em Itália onde fui visto como um adulto incompetente por causa do meu conhecimento limitado de Italiano, eu continuava a ser um adulto. Sou muito grande para ser uma criança. Assim, a alcunha que surgiu perto do fim do primeiro mês em Berkeley na cena que acima descrevi é importante. Eu tornei-me aceite como um adulto diferente ou atípico – uma espécie de criança grande.
Este estatuto como um adulto atípico ou criança grande foi demonstrado de várias maneiras no meu primeiro projecto. Primeiro, fui autorizado a entrar em actividades de pares que se desenrolavam com pouca ou sem disrupção. Podia deslocar-me para dentro da “casinha”, monte de areia e até estrutura para trepar sem muitos comentários para além de uns poucos sorrisos e alguma galhofa. Segundo, eu tinha pouca ou nenhuma autoridade quando comparado com outros adultos. Dado o meu desejo para me tornar parte da cultura das crianças, abstive-me de controlar o seu comportamento. Contudo, naquelas poucas ocasiões em que temi pela sua segurança física, os meus avisos “Tenham cuidado” foram sempre rebatidos com “Tu não és o professor!” ou “Tu não tens nada que mandar em nós!”. Finalmente, ao longo do ano escolar, as crianças pediram-me para tomar parte nas actividades de pares mais formais. Nos aniversários, por exemplo, as crianças insistiam para que me sentasse com elas (num círculo) em vez de na periferia com os professores e pais. Também, muitas das crianças pediram às suas mães que escrevessem o meu nome a par do dos seus colegas em bolachas, guloseimas e bonecadas que eram trazidos para a escola em dias especiais.
Um segmento dos dados de Berkeley gravado em video, capta a minha aceitação pelas crianças e também mostra as diferentes percepções que ganhei acerca da sua cultura de pares na pesquisa etnográfica.

Bologna, Itália (1983-1986)

Eu estava apreensivo com a entrada no terreno no primeiro JI italiano que estudei, devido às limitadas competências em conversação italiana que eu tinha naquela altura. À medida que isso se revelava, esta apreensão ia desaparecendo. Com a ajuda de colegas italianos acedi a um JI e apresentei os objectivos da minha pesquisa (basicamente, o que era ser criança na escola) aos professores. Em Itália, o JI é financiado federalmente e mais de 96% de italianos dos 3-5 anos o frequentam antes de entrarem para o primeiro grau da escola básica aos 6 anos de idade. A escola da qual eu me tornei parte tinha 5 professores e 35 crianças, num grupo de idades mistas dos 3 aos 5 anos.
No meu primeiro dia no JI as professoras apresentaram-me às crianças como alguém dos Estados Unidos que viria à escola para estar com eles ao longo do ano. Confiando na estratégia “reactiva” de entrada no terreno que tinha usado primeiramente em Berkeley, entrei para as áreas de jogo, sentei-me e esperei que as crianaçs reagissem à minha presença. Não demorou muito tempo. Eles começaram a fazer-me perguntas, conduziram-me para dentro das suas actividades de jogo e, ao longo do tempo, definiram-me como um adulto atípico.
Para minha surpresa, a minha aceitação pelas crianças italianas foi muito mais fácil e rápida do que tinha sido com as crianças americanas. Para as crianças italianas (bimbi) quanto mais eu falava no meu italiano desarticulado mais eu era invulgar, engraçado e fascinante. Eu não era apenas um adulto atípico mas também um adulto incompetente – não apenas uma criança grande mas uma espécie criança grande idiota.
A primeira coisa em que repararam foi na minha pronúncia mas rapidamente se habituaram a ele e perceberam que eu usava frequentemente as palavras erradas (má gramática) e, mais ainda, que faziam pouco sentido (má semântica). Ao princípio elas adoraram gozar e corrigir a minha pronúncia. Depressa se tornaram pequenos professores, corrijindo a minha pronúncia e gramática e até repetindo e ajustando o seu próprio discurso, quando eu não os conseguia compreender. Às vezes, eles act out palavras e frequentemente consultadas/consideradas em pequenos grupos, muitas vezes gozavam chamando outros “Adivinha o que o Bill disse agora!”. Não tardou que nos dessemos bem e que a minha confiança em comunicar com as crianças comecasse a crescer. Lembro-me particularmente de um pequeno triunfo.
Eu estava sentado no chão com 2 rapazes (Felice e Roberto) que faziam corridas de carrinhos às voltas em círculo. Felice estava a falar acerca de uma corrida italiana de carros de corrida, enquanto brincávamos mas como ele falava muito depressa eu só conseguia perceber parte do que ele estava a dizer. Contudo, a dada altura eu ouvi claramente a frase “Lui é morto” e eu sabia que isso significava “Ele morreu!”. Percebi que Felice devia estar a contar um acidente trágico de algum acontecimento passado num “grande prémio”. Nesse momento, lembrei-me e usei uma frase idiomática que tinha aprendido no meu primeiro curso de italiano: “Che peccato!” (Que pena!)
Olhando espantado, Felice disse: “Bill! Bill! Ha ragione! Bravo Bill!” (Bill! Bill, Está certo! Boa Bill!”)
“Bravo Bill” – replicou Roberto.
Depois Felice gritou para outras crianças na escola. Algumas das crianças vieram e ouviram com muita atenção o Felice a repetir toda a história do trágico acidente e depois ele disse: “E Bill disse, ‘Che peccato!”. O pequeno grupo animou-se e alguns até bateram palmas com estas novidades. De modo nenhum embaraçado com toda esta atenção eu sentia-me bem – como um do grupo! Eu já não era um adulto a tentar aprender acerca das culturas das crianças, mas eu estava lá dentro, eu estava a fazê-lo, eu era parte da acção.

As coisas já não corriam tão bem com os professores. De facto, confusões e interrupções comunicativas foram frequentes durante os meus primeiros meses na escola. Houve uma série de razões para estes problemas. Primeiro, os professores e eu estavamos auto-conscientes acerca destes problemas de linguagem enquanto que eu me sentia mais à vontade com as crianças. Para os professores era porque ele apenas conheciam uma linguagem e eu era porque o meu italiano era muito pobre. Segundo, nós tentávamos conversar sobre um assunto em vez de tópicos abstractos (como a política de educação pré-ecolar nos EUA) quando comparado com as conversas acera do aqui e agora que eu tinha com as crianças durante as brincadeiras. Terceiro, os professores não eram tão bons a ajustar o seu discurso como o eram as crianças. Eles começavam a falar devagar e eram muito cuidadosos para evitar construções difíceis e expressões idiomáticas. Contudo, uma vez a conversa a “rolar”, as coisas intensificavam-se, emergiam frases complicadas e eu ficava confuso. Quando eu expressava tal confusão, a professora ficava frequentemente um pouco atrapalhada e insistia para que recomeçassemos e, como resultado, raramente íamos muito longe nestas primeiras tentativas.
Dadas as nossas dificuldades, as professoras estavam surpreendidas com o sucesso aparente da minha comunicação com as crianças. Em várias ocasiões, vi um ou outro dos professores chamar as crianças à parte para lhes perguntar acerca do que tínhamos estado a conversar. As crianças não tinham problemas em dizer aos professores o que elas e eu tinhamos dito. Estas explicações incitaram os professores a perguntarem-me porque comunicava eu tão bem com as crianças. Eu disse-lhes que as crianças e eu falavamos de coisas mais simples e directas, relacionadas com as brincadeiras das crianças.
Embora um pouco perplexas, as professoras aceitaram esta explicação e ao longo do tempo, tal como o meu italiano melhorava assim acontecia com as minhas comunicações com os professores.
Todavia, o mais importante é que a descoberta das crianças acerca dos meus problemas comunicativos com os professores foi um aspecto especial da nossa relação. Eles podiam conversar comigo e eu com elas com pouca dificuldade, mas era visível para elas que isso não era verdade no que se referia à minha comunicação com os professores. De facto, alguns pais disseram-me que os seus fihos ou filhas vinham para casa dizer “Há este americano, Bill, na escola e nós conseguimos conversar com ele mas a professora não consegue!”. Em suma, as crianças viam a minha relação com elas como uma quebra parcial do controlo dos professores.
A natureza da especial minha relação com as crianças foi lindamente captada num projecto de escola. Logo no início do ano, cada criança na escola desenhou um pequeno auto-retrato em pedaços de papel separados. Estes retratos individuais foram depois colocados num grande painel de grupo com o título “As caras das Duas Torres todas juntas). O grande painel foi exibido na parede da grande sala de reuniões da escola. Duas Torres era o nome da escola e o painel expressava a natureza comunal do curriculum da escola.

Mais tarde os professores pediram às crianças que falassem um pouco acerca de si próprias. Os professores gravaram as suas respostas, transcreveram-nas e colocaram-nas num portfolio para cada criança a par de fotografias na sala e outros materiais produzidos ao longo do ano. Ao descreverem-se, a maioria das crianças referiu-se às características físicas, disseram que tinham irmãos e irmãs, animais de estimação, o que gostavam de fazer, etc, etc. Contudo, uma menina, Carla, apenas respondeu: “Eu tinha uma bolsa”. Apesar da insistência dos professores e dos colegas, a Carla não disse mais nada. Presumi que a perda da bolsa naquela altura tinha sido terrível para ela.
Depois das crianças terem terminado os seus auto-retratos, as crianças mais velhas desenharam retratos dos adultos. O grupo incluiu os professores, a dade (a senhora que trabalha na escola servindo as refeições e fazendo a limpeza, mas também , por vezes, agindo como uma espécie de avós para as crianças) e eu. Os desenhos foram também afixados num grande painel do grupo e exibidos ao lado do retrato de grupo das crianças com o título: “Os adultos das Duas Torres todos juntos”. Não é difícil reconhecer-me neste grupo.

Depois de todas as crianças terem dito alguma coisa sobre si próprias, tiveram a oportunidade de, numa reunião de grupo, fazer comentários e descrições dos adultos.
As crianças descreveram as características físicas dos professores e dade e também fizeram alguns comentários acerca das suas personalidades. As crianças disseram coisas do estilo os professores são simpáticos mas também um pouco severos e levantam a voz quando as crianças se portam mal. Chegavamos agora ao ponto principal da sua narrativa destes desenhos e descrições. Aqui está o que as crianças disseram acerca de mim:

“Bill é alto e jovem. Tem cabelo preto, olhos castanhos e usa óculos e ele tem barba. Vem sempre à escola e brinca com os meninos, é bom. Bill é americano e não italiano, ele percebe a língua. Com os meninos ele fala italiano muito bem”

A descrição das crianças retrata muito bem as suas percepções e sentimentos acerca de mim. Aos seus olhos eu sou grande e jovem (enquanto que na realidade a minha altura está abaixo da média masculina americana) e eu sou bom porque venho sempre à escola e brinco com elas. Neste sentido, eu sou visto como um amigo. Além disso, a relação é especial até porque apesar de ser ameircano e não italiano percebo a linguagem e com eles eu falo a linguagem muito bem.
Um exemplo de uma gravação de video capta como é que eu entrava nas brincadeiras das crianças e como é que elas se ajustavam à minha presença e até me incorporavam na brincadeira.

Indianapolis Head Start (1989-1990)
Indianapolis é a minha terra natal e quando eu me encontrei com o director do Centro Head Start e os professores com quem ia trabalhar, descobri que partilhavamos muitas experiências por termos crescido naquela cidade. Muito rapidamente me aceitaram no Centro. Contudo, quando lhe falei dos meus planos para visitar o Centro duas vezes por semana ao longo de todo o ano para aprender acerca das interacções e da cultura de pares das crianças, uma professora ficou desconfiada: “Para que quer fazer isso?”, perguntou ela. Ela estava convencida de que em breve eu estaria aborrecido ou muito rapidamente descobriria o que precisava de saber. Mas depois que mantive a minha palavra durante três semanas, os professores começaram a aguardar as minhas visitas e estabelecemos uma boa relação.
As coisas também corriam bem com as crianças que depressa me puxaram para as suas actividades de brincar. Contudo, a minha experiência inicial no Centro Head Start foi, de certa maniera, completamente inesperada para mim. O que foi diferente no estudo do Centro Head Start era que eu era um homem branco num mundo maioritário de mulheres e crianças negras. Pela primeira vez na minha vida ia permanecer um tempo considerável num contexto em que eu era a minoria em tudo, excepto um dos professores e pessoal do Centro, e a esmagadora maioria das crianças eram Afro-americanas. Apesar de estar muito consciente deste facto, as crianças não pareciam preocupadas. Nas primeiras duas semanas várias crianças me perguntaram se eu era o pai de Brandon (um rapaz latino). Eu disse que não e que estava na escola para estar e brincar com eles. Passados cerca de dois meses de pesquisa, uma menina, Tamera, veio ter comigo e disse: “Bill, tu és branco!”. Sem saber exactamente o que dizer, respondi “Yeah, sou!”. E foi tudo.
Durante a terceira semana na escola aconteceu algo importante a respeito da minha aceitação e estatuto de participação na escola, tanto para as crianças como para os professores. O Centro Head Start estava localizado numa antiga escola primária e, como na maioria dos JI, não havia casas-de-banho para as crianças nas salas. As crianças do JI precisavam de ir à casa-de-banho frequentemente e eram muito pequenas para para lhes ser permitido deslocarem-se sozinhas para as casa-de-banho que ficavam fora da sala. Portanto, uma das profesoras tinha de levar as crianças em grupo para as casa-de-banho, duas vezes cada sessão. Eu ia também nessas “viagens” e observava a professora a alinhar as crianças ao longo da parede exterior das casa-de-banho. Depois, ela enviaria três ou quatro rapazes para a casa-de-banho dos rapazes e o mesmo numero de raparigas para a casa-de-banho das raparigas. Esperava alguns minutos para entrar em cada uma das casa-de-banho e apressar as crianças e depois mandava o próximo grupo até que todas as crianças tivessem a sua vez. Depois, voltávamos para a sala com a professora a lembrar às crianças para irem em fila, caminharem devagar e não fazerem barulho para não perturbarem as outras classes.
Devo dizer que não era uma tarefa agradável para os professores. Contudo, fiquei ainda mais surpreso quando um dia, no grupo da manhã uma das professoras me pediu para levar as crianças à casa-de-banho. O pedido pareceu-me perfeitmente razoável e além do mais não se tratava de uma tarefa difícil. Se eu as tinha acompanhado quando os professores levavam as crianças, porque é que eu próprio não as podia levar lá?
O problema é que eu não queria ser visto pelas crianças como uma figura de autoridade e tinha falado com os professores acerca deste aspecto da minha pesquisa. Mas era evidente que eles não tinham pensado que esta pequena tarefa me iria causar problemas ou simplesmente eles não estabeleceram qualquer relação quando me pediram este favor. Decidi que o melhor era concordar em ajudar e esperar que isso não fosse um desafio muito grande à minha relação como um adulto atípico com as crianças.
As coisas começaram bem. Reparei em alguns sorrisos nas caras das crianças quando a professora disse que eu os levaria. Quando saíamos da sala, foi-lhes recomendado que se portassem bem. No patamar e ao descer as escadas elas eram como pequenos anjos, não falavam nem correram, e até a fila estava perfeitamente direita. Também estiveram ordeiramente quando os alinhei contra o muro (os rapazes perto da casa-de-banho dos rapazes e as raparigas perto da das raparigas).
Mandei primeiro quatro rapazes (Charles, Luke, Joseph e Antwaan) em fila para a casa-de-banho e mandei também quatro raparigas (Cymira, Tasha, Michelle e Lamecca). Passados poucos minutos ouvi muito barulho na casa-de-banho dos rapazes.
“O que é que eles estão a fazer lá dentro?”, perguntou Jeremiah. Esta era a mesma pergunta que eu me fazia. Quando fui lá para perceber o que se passava, dei imediatamente conta que estava metido em trabalhos. Joseph tinha ensopado várias toalhas de papel e estava a atirá-las para os outros três rapazes. Antwaan estava junto do lavatório com a água fria a correr no máximo enquanto, com a sua mão por baixo, a atirava borrifando água pelo chão. Entretanto, Charles e Luke riam-se alto, posicionados num ângulo acima dos urinóis tentanto fazer chi-chi para cima do esguicho um do outro nos urinóis mais próximos.
“Ei, vocês aí”, disse eu. “Parem com isso e vão lá para fora”.
“Tu não podes mandar em nós”, disse Charles que pelo menos estava a fazer chi-chi no seu urinol.
“Yeah, ele tem razão”, acrescentou Antwaan. “Tu não és professor”.
Agora ouvia muito barulho lá fora, e corri para lá. Todas as crianças queriam ir à casa-de-banho e perguntavam-me quando é que podiam ir. Brandon era o mais insistente, gemendo “Eu quero fazer chi-chi!”. Eu próprio também queria ir mas essa era a última das minhas preocupações. Voltei para junto dos rapazes e percebi que tentar ser severo não ia ajudar. Charles e Luke tinham-se juntado a Joseph atirando toalhas de papel, uma das quais me acertou atrás da cabeça quando impedi Antwaan de atirar mais água, fechando a torneira.
Antes que os rapazes me pudessem desafiar disse: “Eu não sou professor, mas a turma da Sra. Green está quase a vir aí. Se vocês não vão lá para fora, vamos ficar todos metidos num sarilho!”
“Yeah, Bill, está certo!”, disse Charles. “É melhor irmos lá para fora!”. Os outros rapazes concordaram e eu rapidamente encaminhei os restantes rapazes para a casa-de-banho, incluindo Brandon que correu o mais rápido que conseguiu - ainda bem que não molhou as suas calças.
Agora, pela primeira vez, eu dava-me conta que as primeiras quatro meninas ainda não tinham voltado e ouvia-se muito barulho vindo da casa de banho das meninas. Espreitei mas Tasha gritou “Os rapazes não podem!”. As professores não tinham este problema quando entravam na casa de banho dos rapazes para os apressarem sem preocupações. Decidi aceitar o aviso de Tasha, mas agora eu já estava preparado:
“Acho que a turma da Sra. Green já está a vir”, disse eu alto.
“Uh-oh” – ouvi Michelle a exclamar.
“Yeah, vamos”, disse Cymira. E logo depois, as quatro meninas saíram e o resto das meninas entraram.
O segundo turno de crianças “engonhou” um pouco, mas apressaram-se a dar atenção aos meus avisos sobre a sala da Sra. Green. Pouco depois, todas as crianças já tinham acabado e estavam alinhadas e prontas para partir. Várias crianças sorriam e Charles disse “É fixe vir à casa-de-banho com o Bill!”. Começamos a regressar à sala e as crianças portaram-se bem, tal como o tinham feito quando descemos.
Já na sala, a Sra. Jones disse “Vocês demoraram um bocado, espero que não tenham dado problems ao Bill!”
“Não demos!”, replicou o Carles, olhando para mim com um sorriso.
“Nós gostamos muito de ir com o Bill!”, acrescentou Tasha.
Senti-me seguro. Eu tinha arrumado todas as toalhas de papel mas o chão da casa-de-banho estava bem molhado. Contudo, ele estaria provalvelmente seco quando a sala da Sra. Green lá chegasse.
Alguns dias depois, o sucedido desaguou na turma da tarde, a propósito das minha responsabilidades, e fui solicitado para me encarregar do momento da casa-de-banho, também nesta turma. As crianças deram-me que fazer da primeira vez, mas agora eu já estava melhor preparado. Na verdade, esse papel colocou-me mais próximo das crianças uma vez que elas sabiam que podiam sempre brincar um pouco nestas deslocações à casa-de-banho e me podiam causar dificuldades. Mais ainda, elas tinham percebido que havia um limite para as suas brincadeiras “escondidas/não permitidas”. Tal como no caso das crianças italianas, nós tinhamos certas experiências que partilhavamos fora do controlo dos professores. Assim, o meu estatuto como um adulto espeicla e divertido foi consolidado.

Um dos videos ilustra algumas das minhas interacções com as crianças do Centro Head Start. Implica vários rapazes a transformarem a área da casinha num barbeiro e a cortarem-me o cabelo.

Modena, Itália (1996-2001)

Em Modena, Itália, levei a cabo um estudo acerca da transição das crianças do JI para a escola primária com a minha colega italiana Luisa Molinari. Prosseguimos o nosso estudo através de observações e entrevistas a todas as crianças de 5 anos da escola primária. O foco principal do estudo foi nas crianças, nos últimos cinco meses no JI e nos seus primeiros quatro meses no primeiro ano.
Os meus primeiros dias no JI de Modena foram um novo desafio para mim. Pela primeira vez eu estava num JI em que, na verdade, eu é que era o verdadeiro noviço. Nas pesquisas que realizei no passado tinha entrado em escolas desde o início ao fim do ano e pelo menos algumas (se não todas) as crianças eram, tal como eu, novos no contexto. Além do mais, nestas circunstâncias, eu não só entrava no grupo a meio do ano escolar como quase todas as crianças e professores já tinham estado juntos dois anos e meio. Este facto duplicava a minha “estranheza” e deixou muitas das crianças e adultos curiosos acerca de mim durante os primeiros dias na escola.
Tal como tinha feito em pesquisas no passado eu deslocava-me para as áreas do brincar, sentava-me e deixava que as crianças reagissem a mim. Várias das crianças mais velhas e mais activas no grupo (Luciano, Elisa e Marina) me disseram, frequentemente, o que se estava a passar e geralmente tomaram conta de mim durantes as primeiras semanas.
Eles escoltavam-me para as aulas de múscia e inglês e eu ouvi-os fazer referências à minha presença às crianças de 5 e de 4 anos das outras salas na escola e relatando que “Bill faz parte da nossa sala!”
Apesar das crianças gostarem da ideia de me terem na sua sala, como foi o caso em Bologna, elas gozaram com a minha pronúncia e má gramática, declarando várias vezes que “eles não percebem nada” acerca do que eu estava a dizer. Muitas crianças, também me deram, às vezes, socos na barriga, gozando com a minha “pança grande”. Após eu ter estado a observar na escola durante três semanas, um dia, eu estava sentado numa área em que uma rapariga, Carlota, que frequentemente me provocava, e várias outras meninas estavam a brincar com algumas bonecas. De repente, a Carlota levantou a minha camisola, meteu lá dentro a boneca e berrou para toda a gente “Olhem, Bill está para ter bébé!”. Depois, tirou a boneca, sob as gargalhadas ruidosas das outras crianças.
As crianças, muito rapidamente rejeitavam algumas das minhas ideias ou afirmações. Uma vez, quando estavamos a brincar no recreio com vários rapazes, reparei que Dario, Renato e Valério reuniram alguns paus e colocaram-nos no chão debaixo das barras de trepar. Protegeram os seus paus dos outros e houve uma discussão acesa. Por isso, eu sugeri que os Índios começassem o fogo friccionando os paus juntos. Renato e Valerio decicidram tentar isso mas Dario disse (em muitas palavras) “Bill “maluco”, ele não sabe o que está pr’ai a dizer e isso não vai funcionar”. Os outros rapidamente concordaram e, ao invés, usaram os paus para remexer nas folhas.
Por outro lado, as crianças percebeream que eu como adulto tinha certas competências que lhes eram úteis. Uma vez, Renato, Angelo, Mario e Dario estavam a brincar com plástico, materiais de construção de encaixe. Elas passaram-me algum dos materiais que tinham encaixado e pediram-me que os separasse. Eu aceitei esta tarefa de boa vontade, mas depressa percebi que as peças estavam encaixadas muito mais apertadas do que eu julgava. Com feito, eu primeiro puxei com toda a força nas sem efeito. Uma das professoras, Giovanna, veio até mim, rindo-se, e disse que as crianças tinham encontrado uma utilidade prática para mim. Eu percebia agora que muitas das peças tinham sido apertadas há muito tempo. Quando eu estava mesmo para desistir, tentei tirar uma peça na extremidade da mesa com a outra suspensa sobre a extremidade. Puxei com força e as peças soltaram-se. Angelo e Renato gritaram: “Bravo Bill!” e rapidamente me deram mais peças. Eu separei facilmente as primeiras duas com o meu método inventivo, mas depois voltei a ter problemas porque várias outras peças nem sequer se mexeram. Entretanto, os rapazes começaram a copiar o meu método com algum sucesso, por isso eu fiquei por ali. Depois, reparei que Angelo e Mario estavam a recolher todas as peças separadas e a pô-las dentro da caixa. Eles disseram a várias outras crianças que o Bill as tinha separado mas que ele não iam brincar com elas. Fiquei admirado com isso. Estariam eles com receio de que as peças voltassem a ficar encaixadas de novo? De qualquer modo continuei a trabalhar na aborrecida tarefa até que, para meu alívio, ouvi Giovanna a dizer que era a hora de arrumar a sala.
Uma manhã, depois de estar a observar a escola há cerca de 5 semanas, Giovanna leu um capítulo do Feiticeiro de Oz às crianças. Depois de cerca de dez minutos de leitura e discussão, Giovanna foi chamada para ir atender o telefone, por isso eu deu-me o livro, sugerindo que que continuasse a ler a história. Certas de que isso seria uma tarefa difícil para mim, as crianças gritaram e bateram palmas, pensando que era uma grande ideia. Eu, tive imediatamente um problema ao pronunciar a palavra “espanatalho” que em italiano é “spaventapasseri”. As crianças gozaram e apuparam-me no meu “tropeço” nesta e noutras palavras. Algumas crianças até cairam das suas cadeiras a fazer de conta que estavam histéricas com o meu apuro. A minha tarefa tornou-se ainda mais difícil uma vez que parecia haver “espantalhos” em cada uma das outras frases. Para meu alívio, Giovanna voltou e, quando perguntou como é que eu me tinha saído, as crianças riram-se e disseram que eu não tinha lido bem. Sandra ginchou “Nós não percebemos nada!”. Então, Giovanna pegou no livro mas as crianças gritaram: “Não, nós queremos que o Bill leia mais!”. Pegando de novo no livro, lutei contra mais uma página entre risotas das crianças e devolvendo o livro a Giovanna disse “Já chega, por agora!”
Há dois aspectos da resposta das crianças ao meu problema com a linguagem que são diferentes das minhas primeiras experiências em Bologna. Primeiro em Bologna eu observei um grande grupo de idades mistas onde havia uma grande diversidade de competências de literacia das crianças. Apesar das crianças bolognesas também terem sido iniciadas na leitura e na escrita, isso não era parte central do curriculo. Neste grupo de crianças de 5 anos em Modena, as aulas e actividades relacionadas com a escirta e a leitura eram agora ocorrências quotidianas nestes últimos meses do seu ano final no JI. Apesar delas se rirem dos meus erros, elas perceberam que eu conseguia ler e, até certo ponto, identificaram-se com os meus problemas. Segundo, as crianças em Modena estavam também a estudar inglês e percebiam que eu era competente num lingua estrangeira que era muito difícil para elas. Em suma, era-lhes reiterado que este novo adulto no seu meio partilhava algumas das suas experiências e desafios.
Já no final do ano, em Julho, no JI de Modena tinha-me tornado muito amigo das crianças, dos professores e de muitos pais. Era muito agradável ser capaz de seguir as crianças para a escola primária no Outono. 18 das 21 crianças iniciais (3 crianças foram para uma escola primária diferente) foram divididas em quatro grupos do 1º ano. Eu observei em cada dia cada um dos quatro grupos e, frequentemente, passava a sexta-feira a visitar os professores do JI com o seu novo grupo de crianças de 3 anos. No início, na escola primária, as crianças do nosso JI inicial tentaram reclamar-me dizendo “Bill pertence-nos!”. Contudo, após algumas semanas eu já conhecia todas as outras crianças e, na altura em que me vim embora, em Dezembro, as crianças e os professores viam-me como parte do 1º ano. Eu permaneci membro deste grupo e dos seus professores ao longo da escola primária.
Todavia, houve um incidente logo no início da minha estadia no 1º ano que representa uma memória especial para mim e demonstra a minha grande amizade com as crianças que vieram do JI. Estava-se em meados de Outubro de 1996 e eu tinha estado com as crianças do primeiro ano, cerca de um mês. Eu estava no 1º ano, grupo B. A professora Letizia, tinha deslocado algumas carteiras porque as crianças do 1º A, vinham visitar-me à sala. Eu estava a ajudar quando senti que o chão começou a tremer. Era um terramoto.
“Temos que levar as crianças lá para fora”, disse Letizia à medida que saía rapidamente da sala.
Presumi que tinha que tomar conta das várias crianças na sala enquanto ela ia ao átrio, casa-de-banho ou ao 1º A onde havia alguém de visita. Tudo isto aconteceu numa fracção de segundos e o chão não tremeu senão vários segundos mas parecia que se tinha transformado como se estivessemos em cima de gelatina. Eu agarrei nas 5 crianças que estavam na sala e levei-as para fora onde vi grupos de professores e estudantes junto do portão principal. Tinham-se agrupado por classes e grupos dentro das classes. Algumas das crianças mais velhas estavam assustadas e choravam, mas o tremor tinha parado. Olhando para os edifícios mais altos, à volta da escola, podia ver que não havia danos visíveis.
Enquanto levava as minhas crianças com os resto do 1º A, reparei em várias crianças do 1º ano a irem para debaixo de uma área encoberta onde estavam estacionadas bicicletas para ficarem abrigadas dos chuviscos. As professoras depressa os afugentaram – o objectivo era que ficassem longe de qualquer coisa que pudesse cair-lhes em cima – e voltaram para o grupo. Depois, um dos rapazes, Mario, do 1º A e também do JI onde eu tinha trabalhado, voltou a correr para a escola. Comecei a ir atrás dele, mas um dos seus professores impediu-me e conduziu-o de volta ao seu grupo.
“Mas eu preciso da caneta que eu gosto mais!”, ele protestou.
“Estás louco”, disse o professor. “Tivemos um tremor de terra. Podes ir buscar a caneta depois”
Nesta altura, enquanto o profesor explicava que tinhamos tido um tremor de terra,  várias crianças do JI que estavam no 1º B vieram para junto de mim e agarraram-se aos meus braços e pernas. Passados pucos minutos as coisas acalmaram e os profesores deixaram as crianças circular entre o grupo do 1º ano. Várias crianças que tinham frequentado o JI comigo, desde o 1º A, C e D, vieram a correr para mim e disseram: “Bill, também houve um tremor de terra na tua sala!”
Acabei por ficar com estas crianças até ao final do seu tempo na escola primária, voltando todas as primaveras (excepto uma) para fazer observações entrevistas assim como para trocar correspondência.

Referências
Adler, Patricia and Peter Adler. Peer Power. New Brunswick: N.J.: Rutgers University Press.
Christensen, Pia and Allison James. (2000) (Eds.). Research with Children: Perspectives and Practices. London: Falmer Press.
Corsaro, William A. (1985), Friendship and Peer Culture in the Early Years. Norwood, N.J.: Ablex.
Corsaro, William A. and Luisa Molinari (2000), “Entering and Observing in Children’s Worlds: a Reflection on a Longitudinal Ethnography of Early Education in Italy.” in Research with Children: Perspectives and Practices. ed by Pia Christensen and Allison James, 179-200. London: Falmer Press.
Fine, Gary and K. Sandstorm (1988), Knowing Children: Participant Observation with Minors. Newbury Park, CA: Sage.
Mandell, Nancy (1988), “The Least-Adult Role in Studying Children,” Journal of Contemporary Ethnography, 16:433-467.
Rizzo, Thomas, William A. Corsaro, and J. E. Bates (1992), “Ethnographic Methods and Interpretive Analysis: Expanding the Methodological Options of Psychologists.” Developmental Review, 12:101-123.


[1] No original researcher-created
[2] No original “one-way screened”